Tuesday, April 10, 2007

Pico da Bandeira - A história do acampamento.

Sexta-feira

O dia começa bem cedo.
5:30 - Acordo para terminar de arrumar a mochila para o acampamento.

6:10 - Saio de casa com a maior mochila que eu já carreguei na vida, pesando pelo menos uns 15kg. Todos que passam por mim olham assustados para o tamanho da mochila. Obviamente estou indo acampar. Espero o ônibus por alguns muitos minutos com a colossal mochila nas costas, mal aguentando aquele peso, mas com uma tremenda preguiça de tirar e ter que, literalmente, vesti-la de novo quando o ônibus chegar. Após um tempo eu desisto de ficar carregando aquele peso enquanto o ônibus não passa, e deixo a mochila no chão.

6:30 - O ônibus passa. O motorista vendo o tamanho da mochila abre a porta do meio para que eu possa entrar com aquele monstro, e deixá-la em algum canto, e espera para que eu saia e entre pela porta frontal como dizem as regras, passe pela roleta e pague a passagem.

7:05 - Chego no local esperado para esperar a minha carona. Enquanto espero observo algumas pessoas um tanto quanto singulares passando por mim. Quatro garotOs de uns 18 ou 19 anos, sendo que dois deles estavam de mãos dadas, andando como um casal de namorados e demonstrando a maior tranquilidade, e os outros dois exalando aquela aura de sexualidade reprimida, numa certa tensão sexual. Estavam voltando da famosa balada. Um breve instante de tempo depois, vejo mais duas figuras singulares passando por mim. Dois garotos estranhos um com cabelo meio rosa, e o outro com cabelo meio verde, um deles com um bracelete de espinho no braço, e ambos com aquele ar meio-punk com roupas rasgadas. Uma estranha mistura de punk, headbanger clubber e emo, como se estivesse saído daquela propaganda da Coca-Cola que exalta as diferenças. Realmente muito estranho. Passando mais algum tempo, dois caras passam por mim, e um dele vendo o tamanho daquela mochila nas minhas costas, me cumprimenta e me deseja boa sorte no acampamento. Engraçado, mas divertido. Eu cumprimento de volta, e agradeço ao sujeito.

7:15 - Minha carona, a Sarah, chega e iniciamos nossa jornada rumo ao Parque Nacional do Caparaó, na divisa de Minas Gerais e do Espírito Santo. Mas antes devemos passar em Ponte Nova para pegar um amigo dela que vai seguir viagem conosco.

9:30 - Em algum lugar entre Mariana e Ponte Nova, debaixo de chuva e numa estrada cheia de curvas e não tão bem conservada assim, o carro entra rápido demais numa dessas curvas, começa a derrapar, e dá um giro de 270° saindo de costas pelo acostamento da pista da direita. Felizmente, como não vinha nenhum veículo na direção oposta, e nem seguindo logo atrás da gente, ainda estamos vivos, e o carro não sofreu nenhum arranhão aparente. Depois de ficarmos parados uns 5 minutos na estrada, parados, respirando, continuamos a viagem.

9:45 - Passados alguns minutos após o quase-acidente fatal, ouvimos um barulho vindo da parte da frente do carro. De repente a luz da bateria acende no painel, e a direção do carro que era hidráulica fica mais dura que o normal. Passamos por uma placa indicando um posto logo a frente, e paramos o carro lá. Descobrimos que a correia que controla a direção hidráulica, o alternador, o ar-condicionado, e mais alguma coisa que eu não me lembro, está arrebentada. Os frentistas do posto, em seu otimismo dizem que vai ser difícil encontrar um mecânico, e uma loja de auto-peças aberta, na Sexta-Feira da Paixão, e que é provável o carro só vai poder ser consertado para continuar a viagem no dia seguinte. A Sarah aciona o seguro, que chama um guincho vindo de Mariana, depois liga para o amigo que já está esperando em Ponte Nova, dizendo que é provável que atrasemos um pouco.

10:45 - O guincho chega. Leva o carro até Mariana. O motorista do guincho leva o carro até uma oficina conhecida dela, onde dois mecânicos "workaholics" trabalham. Um deles após ver o problema do carro, diz que vai tentar conseguir a tal correia e desaparece. Alguns minutos depois, e provavelmente após acionar alguns contatos, retorna com a tal correia, e a troca, num processo que demora pouco mais de 10 minutos. Após fazer uma pequena análise, o mecânico repara que uma das polias por onde a correia passa está um pouco fora do lugar, e isso vai fazer com que a correia se desgaste mais rápido.

12:00 - O carro está pronto. A Sarah alguns reais mais pobre, e um pouco traumatizada pede para eu dirigir por parte do trajeto. Novamente nos dirigimos na direção de Ponte Nova.

13:15 - Chegamos em Ponte Nova. Encontramos o Tomaz, uma figura singular, mas muito gente boa, amigo da Sarah, e que vai acampar conosco. Continuamos viagem sem mais problemas até Alto Jequitibá. Vale ressaltar que durante praticamente todo o trajeto fomos assolados pela chuva.

15:30 - Paramos para comer num restaurante na pequena Alto Jequitibá.

16:30 - Chegamos no Parque Nacional do Caparaó. Uma chuvinha fraca estava caindo. Na portaria, fomos informados que a estrada até o primeira camping estava interditada para carros sem tração nas 4 rodas. E que se quiséssemos subir teríamos que deixar o carro, e subir a pé até lá. Uma pequena nota: o primeiro camping, chamado de Tronqueira ficava a 6,5km de distãncia da entrada, e nossa reserva era para o segundo camping, chamado de Terreirão, e se encontrava a 4,5km de distância do primeiro. Outra nota: a entrada do parque está a 1400m de altitude, a Tronqueira fica a 1900m de altitude, e o Terreirão a 2400m de altitude. Temperatura média do Terreirão à noite nesta época está abaixo de zero graus centígrados.

17:00 - Resolvemos subir a pé, mesmo debaixo de chuva. Retiramos algumas coisas "supérfluas" das mochilas, como parte da nossa comida, e alguns outros apetrechos, na esperança de retornar depois. (Nunca voltamos até o dia de vir embora). Com as mochilas, capa de chuva, e blusa de frio, iniciamos a nossa subida. Menos de 10 minutos depois já tinha tirado a capa de chuva e a blusa de frio, devido ao excesso de transpiração. A chuva passou um tempo depois, mas a umidade estava muito alta, e logo, começamos a andar em meio a uma neblina. Depois de 3km subindo até o acampamento, cruzamos com um jipe descendo, pedimos carona até a Tronqueira, e o motorista disse que nos levava até lá em cima por 15 reais. Devido ao meu esgotamento físico com aquela subida, toda aquela umidade, e toda a minha transpiração, aceitamos a proposta do sujeito.

18:50 - Chegamos até a Tranqueira. O ponto mais alto onde veículos terrestres motorizados conseguem chegar. A partir daqui até o Terreirão teríamos que seguir uma trilha no meio do mato, de 4,5km. Colocamos as mochilas nas costas e começamos a subir. Por incrível que pareça, a partir deste ponto, todo o meu cansaço desapareceu, e por algum motivo estranho aquela caminhada, com aquela mochila gigante nas costas começou a me revigorar. O caminho estava totalmente escuro, mas felizmente era uma trilha razoavelmente fácil de se seguir à noite, com lanternas.

19:30 - Encontramos um grupo parado na trilha. Dois casais, com uma quantidade imensa de tralhas. Eles pediram nossa ajuda para carregar as coisas, e resolvemos ajudá-los, e eles seguiram caminho com a gente. Acabei levando além da minha mochila, mais um saco de dormir deste pessoal. Eventualmente, as meninas deste grupo resolviam parar pra descansar, e com isso a caminhada não rendeu tanto quanto deveria. Após 3h de caminhada, seguindo a trilha no escuro, e sem a menor noção de onde estávamos, começamos a ficar meio preocupados, pensando se não tinhamos errado o caminho em algum lugar. Não havia o menor sinal de nenhum camping por perto, nem luzes e nem barulho, sendo que já deveríamos estar bem próximos. Continuamos andando.

22:45 - Uma das meninas do grupo que nos acompanhava começa a passar mal. Eles resolvem parar, e o nosso grupo resolve seguir. Se encontrássemos o acampamento, ligaríamos para eles, para avisar se eles estavam longe ou não. (O meu celular estava com sinal.) Continuamos a caminhada, e menos de 5 minutos depois estávamos no Terreirão. O Terreirão se localizava num pequeno platô, rodeado de pedras, por isso não ouvíamos o barulho, e nem luzes para nos guiar.

23:00 - Chegamos no Terreirão. Mandei uma mensagem para o grupo retardatário. Achamos um local para as barracas e começamos a montar acampamento. A temperatura devia estar abaixo dos 10 graus, mas devido ao grande esforço físico, não estávamos sentindo frio nenhum.

23:30 - Terminamos de montar as barracas. Tudo que queríamos era um bom banho. No camping não tinha água quente, como todo bom camping no meio do nada, mas tinha alguns chuveiros, e banheiros. O Tomás (eu realmente não sei se é Tomaz, Tomás, ou Thomas, por isso vou usar todas as variações, e em algum momento eu devo acertar o nome correto), então, foi o primeiro a resolver tomar banho. Alguns bons minutos depois, ele volta, diz que o banho foi ótimo, mas que a água está fria. A Sarah então acha que é uma boa idéia tomar um banho também, e foi. Ela também volta, feliz da vida, com o banho. Então, após as duas cobaias terem ido, e demonstrado uma certa satisfação, eu decido ir também. Ao chegar no banheiro, ligo a torneira, e percebo que a água não estava fria, ela estava congelante. Só de colocar a mão lá de baixo eu já deixei de sentir a mão. Resultado... Não tomei banho. Tirei a camisa, me molhei um pouco na água, me ensaboeie com a mão rapidamente, e passei água novamente para tirar o sabão. Só para tirar aquele sal residual da transpiração excessiva. Se eu entrasse debaixo daquele chuveiro, eu provavelmente estaria lá até agora, congelado, e ficaria por algumas eras geológicas ali.

Sábado

00:45 - Após o "banho", voltei. Comemos, bebemos e conversamos um pouco antes de ir dormir.

1:15: - Fomos para as barracas e dormimos. Felizmente, só pegamos chuva bem no início da caminhada. Depois o tempo deu uma trégua pra gente, e não chegamos enxarcados no Terreirão.

continua...

Obs.: Os horários não refletem exatamente os horários reais, mas são mais ou menos os citados, e refletem de maneira razoável a passagem do tempo.

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